sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

As Árvores

Se as árvores hão de ser verdes e copadas,
Eu, o que hei de ser?
A copa que possuo não tenho
E minhas folhas nunca foram verdes.
Elas dão flores e frutos. E eu?
São as árvores menos árvores
Se menos frondosas são suas copas,
Se o outono desbotou suas folhas,
Se o vento roubou-lhes as pétalas de suas flores
E o tempo apodreceu seus frutos
E os fez tombar ao chão?
São menos vivas, são existência decadente
As que são mais espinho,
As que os galhos se retorcem com o sofrimento
As que os frutos são venenosos,
As que se erguem melancolicamente sozinhas
No meio de vastos campos,
As que tomadas por pragas e ocas por dentro,
As que não conseguem crescer,
As que não se sustentam de pé?

Ora, a quem quero enganar?
Seja o que for, é preferível descansar
Sob aquelas que nos fornecem sombra
Nos dias de sol escaldante
E que são firmes o bastante
Para pendurarmos rede nelas
E que os frutos são doces
E as flores colorem a paisagem.

*Poema do Vida e Poesia

Breve Biografia do Soldado Desconhecido


Nascido nos campos a brincar de subir em árvores,
Observar as formigas e caramujos,
Comer frutas do pé e ouvir o cantar dos pássaros,
Esconder-se junto às vacas e dormir no bosque,
Fugir a cavalo e dos cavalos,
Não tardou em interromper-se a infância
Para ser recrutado infante
E lançado aos campos de batalha.
Lutando bravamente contra iguais
Na defesa dos interesses dos diferentes
Em nome de uma das maiores mentiras da história: A Nação.
Antes estava a salvo no alto das laranjeiras.
Desesperou mãe, irmãs e tias
O Tombo fatal nas trincheiras.
Para o 'governo': número de estatística.
Falsamente homenageado, o soldado desconhecido,
Ao contrário da indústria de armamentos, nada lucrou.
Nem sua família que perdeu um ente querido.
Nunca percebeu porém, que dominação e guerra
Só podem existir se há gente que as faça nesta Terra.
Jaz o soldado desconhecido de toda batalha
Empurrado para a guerra por uns canalhas.

*Poema do Vida e Poesia

Trabalho e Lazer

Às vezes tenho a impressão
De que curtos são os dias.

Não tenho tempo para escrever poesia,
Pensar e rascunhar filosofia.

Tocar meu violão e ouvir música,
Ler e não fazer nada.

Além disso tem as tarefas
Para só manter a existência.

Para tudo isso ainda tenho que trabalhar.
Ah, tantas horas por dia!

Dizem que deve se fazer o que goste,
Mas gosto é de não fazer nada

Que seja por obrigação.
Querem que se convença de ser torturado?!

Se menor fosse a jornada...
Concluo que não o dia é curto,

Mas longos são o trabalho e a exploração.

Fins de Novembro

Àquela noite os deuses choraram
E a mãe natureza fechava os olhos
Ante tão triste e terrível cena.
No corpo os sentimentos não moravam.
Retorcido ao chão pelos da vida espólios
Que fizeram a existência pequena.

Não mais brilhava a vida do sol
Até duas semanas depois
Quando aquela alma vazia
Entrava para o glorioso rol
Onde a treva densa se depôs
Para a leveza que se fazia.

Os ventos sopraram a desgraça
Para outros lugares, desconhecidos,
Onde ela o homem não toca.
Do espírito jovial volta à caça
A figura que da morte venceu os perigos
Após ver-lhe as presas da boca.

Exuma-se se sabe lá de onde
A força que funciona como motor
Para a inalcançável vitória.
Avista-se agora a ponte
Que dirige ao ponto de se impor
Acima do mundo, da escória.

Eis a vitória!

Drama da Vida

Divertem-se as pessoas,
Ao assistir na TV
O tal reality show.
É! Soltam risadas boas.
Deliciam-se ao ver
O hilário que passou.

Outros se põem no ridículo
Em sua mais ampla esfera
Expondo-se ao grand público.
Criando, com todos, vínculo
Invasor e que não espera
A vida de alguém pudico.

Como é boa esta invasão
Que se dá até certo ponto,
Que se pode controlar...
Mas não pode gostar ou não
O homem sobre qual conto.
Aquele que não tem lar.

Expostos os momentos íntimos
Vinte e quatro horas por dia
Os fazeres do mendigo.
Em nenhum instante, ínfimo
Segundo, para si, podia
Desfrutar em um abrigo.

Por todos os olhos vistos
Sem sequer ser percebido.
Ninguém vê nenhuma graça.
Candidatou-se para isso?
Nada toca o seu ouvido
Para que feliz o faça.

Esquecido vive e morre.
Quieto é o passamento...
Sobre ele a luz fulgurava.
Mente que agora o socorre
O médico desatento...
Outra vez a rua escura.

Dia da Poesia


Parabéns pelo dia da poesia
Cada vez mais fria e vazia
Falsamente interpretada e escrita
Por pretensiosos intelectuais de mentira.

Essa gente nova sem talento
Destrói num só momento
Um clássico de muitos anos
De artistas sobre-humanos.

Tenho pena do que meus netos verão:
A eternidade da estagnação.
A inefável e magnífica beleza...

As empolgantes e lindas proezas...
Não são mais apreciadas e vistas
Pelos mais recentes “artistas”.

Passos, passos... Passos!


Bom dia, nasceu o sol!
Mas apenas a Terra se move, anda.
Preste atenção! O mundo parou!
Perpetua-se o enfadonho ciclo da vida.
Sentido? Nenhum. Objetivo? Pequeno.
Miséria, futilidade, egoísmo? Eternos.
Fechar os olhos é compactuar.
Compactuar é sofrer se
Alguma vez já se descortinaram as janelas.
Ver, ouvir, pensar? Não quero.
Ah! Estou profundamente farto.



Zoológico

Dói-me fundo o vazio por não ter nada;
Não ter um lugar privado e silencioso
Para, em um momento como este, deixar minha vida abandonada.
Minha penúria pessoal e muda não me permite gozo.

Da noite, na calada, rolam quietas e amargas lágrimas
Pela ardência que me sobrou nas costas
Após ter-me sido roubado o par de asas, a dádiva
Que sequer um dia tive, mas deixou a ferida exposta.

A marca da vergonha e da humilhação, do desgosto
Que sei, que sou, que sempre serei mesmo se obtiver um novo par.
Da ferida surgirão asas de um preto, o mais fosco
Destacando a presença e o rosto daquele não pode voar.

Não posso fugir dos olhares curiosos e/ou opressores
Que me julgam, desta jaula, pelo “lado de fora”
Com seus padrões morais de valores sem valores.
Não posso gritar a desgraça que, em mim, mora.

- sumam desapareçam, morram todos seus miseráveis!
Esse é o grito de desesperança entalado na garganta
Que todas essas ações abusivas, egoístas e deploráveis,
Esse estupro da privacidade, em mim, planta.

Brilhar no céu uma estrela é o que falta,
Que permita não cortarem meus desejos, que
Deixe-me vagar de maneira tranqüila e incauta
Simplesmente aproveitando meus, de sonhos, lampejos.


*Poema d`O Eu Mais Íntimo

Do lado de dentro

 Minha cabeça pende sobre meu pescoço
 A olhar firmemente sempre pro chão
 A afundar-me num profundo poço
 Da mais aguda e triste lassidão.

 Talvez eu possa mais não quero,
 Em hipótese alguma, do fundo sair.
 Quero apodrecer aqui como um mero...
 Qualquer coisa sem coragem para subir.

 Não é possível. Eu não consigo
Jamais arranjar um lugar qualquer
 No qual eu possa ver um abrigo.

 Sinto-me falso, cínico, mesquinho
 Por ter asas em sonho,
 Porém não ser um passarinho.