quarta-feira, 30 de maio de 2012

Sobre a Morte



A morte é uma criança
Na mão de quem somos brinquedo
Por vezes quebrados ao primeiro toque,
Por vezes esquecidos no fundo de um baú.
O brinquedo favorito
Em alguns casos logo tem os braços
Pernas ou cabeça arrancados.
Há vezes em que ela,
Como em um livro de colorir,
Pinta-nos de branco os cabelos.
Em outras, tira-nos fio a fio.
Marca-nos o rosto, a testa,
Com nossas alegrias e preocupações;
Encarquilha-nos a pele
Como massa de modelar;
Atira-nos fora por não mais lhe agradar
Ou por pura malcriação.
Mas, no fundo, é por diversão!
Deixe ela se distrair.
Para que condená-la, maltratá-la?!
Brinquedos ela tem tantos!
E afinal, não sabe o que faz.
É somente uma criança!

Alma



Da alma, todos têm uma opinião a seu respeito,
Ainda que todos conceitos distintos, insuficientes,
Pois a alma, apesar de uma, é múltipla. É do seu jeito.
É indefinível. É poesia. É o inconsciente (consciente?)

Não é sua, não é de Deus, do Diabo, de ninguém.
Não se sujeita e , a pequenez, abandona.
É tudo. Não quer nada. Nem mal nem bem.
Não pode ser censurada. É livre. De si mesma, dona.

É, de se tornar si mesmo, vontade.
É da necessidade de Universo, o sabre.
É vontade de poder e desejo de liberdade,
E, com isso, a síntese da história, de Luce Fabbri.

A alma é aquilo que ignora o irrealizável,
Não crê no e nem se curva ao impossível,
É tudo o que não nos é exatamente palpável,
O que é idealista, idealizado, idéia, indizível.

É algo que transcende o que é finito e marcado,
Não gosta de imposições e controles, interferências...
Não se submete a responsabilidades legais.
É como se a alma dissesse:

“Me deixe em paz! Deixe que eu me aproxime quando desejar...
Deixe eu ser cada dia como quero. Deixe eu estar próxima, distante,
Deixe que eu possa, de fato exercer a construção
Do meu sentido, ou da busca dele.”

Inventamos a alma para tentar expressar aquela dor que não dói, mas é dor.
Que é tão dor que é maior que o próprio corpo,
Que não pode se prender a quem a sente.
Não é abstrata. É concreta. É por si.

Não é uma dor que dói em mim, mas A Dor.
Inverte-se a relação de sensação.
Eu que sinto sou só um instrumento dela para se manifestar.
Isso para todos os sentimentos, que são maiores que nós.

A alma é aquilo que não conseguimos mais explicar.
Olhamo-nos no espelho e vemos que o corpo envelhece
Mas ainda há, à espreita para o bote, em algum lugar
O grito contido dos sonhos ainda jovens.

A alma é a parte de nós que, a razão, rejeita.
Que, a relação de causas e efeitos, não tolera,
Que é inverossímil e, a lógica, ao chão, deita.
É o mundo que está por vir. É todas as Eras.

Não aceita tempo. É passado, presente e futuro.
É o nosso eu que sonha. É a vida em si, sincera.
Não é com religião, religiosidade. É sentimento Puro.
Saber dela? Ah, se eu pudesse... Quem me dera.

Noite na Serra



Lembro então que realmente há no céu ainda
Aquelas estrelas que moram na memória.
A voz da natureza não está finda.
Sussurra o vento e os sapos cantam histórias.

Essa fumaça que sobe das chaminés
O cheiro e o suave crepitar da lenha
Vivem o mundo sem pressa, sem bacharéis
Da vida do campo, na serra. Ah, pois venha

Sopro frio do princípio de primavera!
Permito-lhe apagar o fogo da lareira
Se eternizar a placidez desta atmosfera.

O coaxar, os grilos, nem eira nem beira,
Eu, silêncio e amplidão. Sempre! Quem me dera!
Não há quem vivendo essa noite, não o queira.

domingo, 27 de maio de 2012

Poeta?



Não se deseja ser poeta.
Não se esforça em ser escritor
Apenas a vida o faz.

Não se pode aceitar ou negar.
Sem sequer se dar conta,
A mão toma para si a caneta
E se põe a rascunhar, escrever.

Não se pode escolher das coisas da vida
Aquilo que se quer ser. Não escolhemos o que somos.
Só podemos negando, escondendo e mentindo,
Escolher o que parecer.

Um Poema Perdido



Não, não. Não chovia; chove.
Na minha alma sempre chove.
Mas não mais como na de Fernando Pessoa.
Na minha, é de início de abril. Outono.
Mas sem melancolia.
Nostalgia sim. Saudade.
Desejo da mesma chuva que despede,
Mas anseia, ou sabe que vai, voltar.
Aqui sempre chove, mas, e aí?

Parece que aí não.
Não só não chove, como secou.
Alastram-se as areias do deserto.
Há somente o rastro das serpentes invisíveis
A assustar enquanto se caminha,
Guiado por miragens,
Em vã busca pelo oásis prometido, sonhado.
Mas, o alternar de silêncio e tempestade de areia
Conta o destino para o qual
Os olhos teimam em se fechar.

Ah, a esperança...
Mesmo depois de perdida,
Mantém-nos a caminhar, perambular,
Nem que seja para tentar (re)encontrá-la.

Parece que estou só
Abraçando o ar
Falando com as árvores e imaginando
Que o farfalhar das folhas é voz que me responde.

Tudo bem, ficarei em silêncio
Esperando o minuano passar.